“Peço-te o prazer legítimo. E o movimento preciso. Tempo, Tempo, Tempo, Tempo. Quando o tempo for propício”. Ok Caetano, mas quando é que esse tempo é propício? Tempo de quem? Tempo do que? Meu tempo ou o do outro? Tempo do ser humano, de Deus ou dos astros?
A frase que eu mais escutei esse ano (e falo até para mim mesma) é: “dê tempo ao tempo”. Dizem que o tempo cura tudo. “O tempo vai te fazer superar, o tempo vai te fazer entender o porquê foi assim e não como você imaginou que ia ser, o tempo vai te mostrar, o tempo vai reconstruir, o tempo vai te ajudar a esquecer”. Não parece tudo tão distante de acontecer? Não parece muita coisa para ficar esperando que aconteça sem saber quando? Não parece muita responsabilidade para algo que não tocamos ou não vemos? E eu não sei vocês, mas eu não tenho paciência nenhuma para esperar esse tal de tempo resolver as coisas aqui dentro ou lá fora. E volto a perguntar: o tempo de quem?
Os gregos antigos possuíam três conceitos para representar o tempo: Chronos, Kairós e Aíôn. Não vamos falar de mitologia (vale a pesquisa se você se interessar sobre o tema), mas vamos a parte que nos ajuda a entender que tempo é esse. Chronos é tempo do relógio, o que pode ser medido. Kairós é o tempo indeterminado, metafísico, o tal do momento adequado, em que algo especial acontece. Aíôn é o tempo sagrado, eterno e imensurável. Vamos ficar com Chronos e Kairós.
O Chronos são as horas comandadas pelo relógio. Ele é um limitador para a quantidade de atividades realizadas durante o dia, semana, mês e ano. No entanto, somos capazes de controla-lo sabendo que o dia tem vinte quatro horas exatas. Chronos pode ser sufocante quando a ansiedade controla o nosso tempo e não vemos as horas passarem, os dias melhorarem, a dor ir embora, a tristeza sumir, o entendimento sobre determinada situação surgir ou o melhor acontecer. E é ai que o tempo não passa mesmo, a angustia toma conta junto com a nostalgia de relembrar um passado melhor, de planejar um futuro sem nem saber o que é o presente.
Já Kairós não tem hora marcada e nos convida a aproveitar a vida com mais leveza, de forma mais despojada, desapegar do tempo cronológico, da pressa de resolver a vida em um passe de mágica e de eliminar o sofrimento em um estalo. Kairós não pode ser controlado e significa o momento certo que, claro, estará em um tempo físico determinado por Chronos, mas que não cabe a nós viver a angustia da espera por ele.
Só precisamos dar tempo ao tempo.
Eu sei, é difícil se apegar a uma tal de hora certa, a esperança de que tudo vai ficar bem, sem ter controle algum sobre a situação. E sabe, apesar de toda a minha (e talvez a sua) impaciência, esperar é sabedoria. A ansiedade não nos deixa analisar o que nos ocorre com objetividade. Ter pressa em resolver tudo, as vezes faz com que não resolvemos nada – mesmo porque, as vezes nem está nas nossas mãos resolver. Por isso, a calma pode ser o melhor remédio diante daquilo que não depende de nós.
Tudo bem, eu também queria estar no controle do tempo. Eu também não aguento mais as pessoas me aconselhando a dar tempo ao tempo – embora prefiro me apegar a essa frase e deixar rolar. Também queria ter a resposta de quando e como eu, você e nós vamos sair dessa. Seja qual lá for a minha e a sua “dessa”. Claro que seria incrível se pudêssemos enxergar o que vai acontecer lá na frente, mas não dá. Dizem que é melhor assim. Eu não sei se concordo, porque ainda acredito que seria melhor sabermos o que vai acontecer e se preparar, ter o controle, mas não tem como.
O tempo de Kairós nos ensina a ter esse entendimento. De que no lugar da ansiedade, tentativas de controle e imediatismo, podemos colocar uma vontade de perceber a beleza e a oportunidade que existe em cada instante. De valorizar o hoje, aqui e agora. De preencher nossos pensamentos com sabedoria e amor e preencher nossos dias com o que nos faz bem, com o que é útil e agradável. De sermos conscientes da efemeridade do tempo e alegres pelo simples fato de estarmos vivos e quem sabe desenhar um novo percurso.
E finalizando com mais um pouco de Caetano Veloso, por favor: “Tempo, Tempo, Tempo, Tempo. Entro num acordo contigo”.
[…] a certeza que eu tenho é de dar tempo ao tempo. Não da boca para fora. De realmente acreditar que o tempo é o que vai acontecer da forma certa. […]